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17 julho, 2008

Duas Estrelas do Mar e um Peixe Prateado

Autor: Francisco Fernandes

Ilustrador: Janine Fernandes

Editor: Associação de amigos do Centro de Expressões Artísticas


"Olá estrelas do mar!, respondeu o peixe prateado e continuou: “ Estou sozinho e vou nadando por aqui. Procuro amigos. Bem…na verdade eu nem sei bem o que é isso de ter amigos, acho que nunca tive nenhum, mas…”

É com este pequeno segmento que acabámos de citar que Francisco Fernandes abre a narrativa de Duas Estrelas do Mar e um Peixe Prateado.

Tratando-se de um autor madeirense, já com alguma produção no campo da literatura de recepção infantil, Francisco Fernandes revela, no texto que estamos a compartilhar, conhecer profundamente um dos problemas com que a humanidade hoje se confronta: o isolamento, num mundo globalizado.

Nesta história conhecemos um Peixe Prateado, personagem e herói principal de uma história de amizade, que nos faz ingressar na vida simples de um peixe e da sua incapacidade de se assumir como amigo de alguém. Contudo, por circunstâncias várias do destino, encontrou as estrelas do mar que, sem banalidades discursivas, lhe falam da amizade incondicional e da sua dinâmica criativa, relacional e convivial que implica a mobilização de sentidos perante a vida.

Este tema da amizade, tão comum nos livros para crianças mais pequenas, faz-nos antecipar propostas de alteridade e reciprocidade que nos remetem para as desastradas relações humanas tão separadas, divididas e destruídas apesar de, muitas vezes, tão próximas virtualmente, pela força das tecnologias que nos resguardam de confrontos connosco próprios.

Lembramo-nos de Leonardo Coimbra (1915:105) quando diz que o mal, é a ignorância dos outros, é a queda, a morte como separação, contrária à relação amorosa. Nesta perspectiva, a ignorância dos outros é que constitui o inferno. (Pereira, 2000:129)

O Peixe Prateado estava no seu inferno, sem amigos, e por isso desejava desesperadamente ter alguém com quem partilhar o seu caminho. As estrelas, símbolos de guias espirituais que cruzam os céus/mares ensinaram-lhe a forma de tornar a sua aspiração possível. Ao porem-se em com – tacto com o peixe devolveram-lhe a humanidade perdida permitindo-lhe compreender que os actos de conhecimento do outro, do mundo e do universo são também e acima de tudo actos de estima e de atenção carinhosa, que lhe vão possibilitar encontrar-se com ele próprio e com os seus mais recônditos receios.

No final da história, o Peixe Prateado já sabia o que era ser amigo e tinha interiorizado também aquele sentimento extraordinário, que só a língua portuguesa consegue inteiramente transmitir:

“Agora que já somos amigos…acho que já sei o que é sentir saudades…”